O CANDIDATO E O LIMITE DE GASTOS EM CAMPANHA
Em 6 de março do
corrente ano o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou mais 3
(três) resoluções aplicáveis às Eleições de 2014, dentre elas
a de nº 23.406, alusiva à arrecadação e gastos de campanha. No
citado ato existe, entre outras, uma inovação a merecer destaque.
Trata-se da limitação imposta aos candidatos, concernentemente ao
ato de dispor do próprio patrimônio, para gastos em campanha. O
art. 19 da mencionada resolução trouxe, no parágrafo único, a
seguinte redação: “A
utilização de recursos próprios dos candidatos é limitada a 50%
do patrimônio informado à Receita Federal do Brasil na Declaração
de Imposto de Renda da Pessoa Física referente ao exercício
anterior ao pleito (arts. 548 e 549 do Código Civil).”
Foi veiculado na imprensa, inclusive com informe constante no sítio
do TSE, ter aludida inovação partido do Min. Dias Toffoli (relator
das resoluções aplicáveis ao pleito de 2014), sob a justificativa
de que ninguém “pode
doar mais da metade do que tem”
(site do TSE).
Sempre
respeitando as opiniões contrárias, a novidade pode estar destoante
do regramento civil aplicável à espécie, senão vejamos.
Os
artigos objeto do embasamento relativo à inovação (arts. 548 e 549
do Código Civil – Lei nº 10.406/2002) encontram-se previstos no
Capítulo IV (da doação) do citado código. A lei civil, no art.
538, inicia o tema definindo doação como sendo “o
contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu
patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.
Assim, doação pressupõe doador e beneficiário da doação (duas
pessoas), envolvendo “tanto
a disposição material quanto jurídica da coisa, isto é, o poder
de alienação”(Código
Civil Comentado. Coordenador Min. Cezar Peluso. 6ª ed. Manole. São
Paulo, p. 1202). A
preocupação do TSE, conduzida pelo citado ministro, certamente se
encontra relacionada ao disciplinamento contido no art. 548,
afirmativo de que é nula
a doação de todos os bens que possam comprometer a subsistência do
doador. Entretanto, em podendo o proprietário do patrimônio
(candidato ou não), em vida, dispor para uso próprio da
integralidade de seus bens, vê-se – novamente sem embargo de
opinião contrária – poder estar a fundamentação da resolução
equivocada, em decorrência de tanto não se tratar de doação, nos
casos de utilização de recursos próprios em campanha, quanto pelo
fato de inexistir lei em sentido material que estabeleça tal
limitação. As imposições de limite previstos pelos parâmetros de
2% e 10% para doação, relativos a pessoa jurídica e física,
respectivamente, previstos no art. 25 da citada resolução (nº
23.406), possuem sim previsão legal (art. 23, § 1º, incisos I e II
c/c art. 83, § 1º da Lei nº 9.504/97), o que não ocorre para o
parágrafo único da resolução.
Sobre
a temática, o art. 1.228 do C. Civil preceitua que o “proprietário
tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de
reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou
detenha.”. Dizendo
de modo mais claro: não há previsão legal que limite ao candidato
a utilização de todo o seu patrimônio, no “investimento” em
campanha, podendo o TSE ter acertado, todavia, apenas no que disser
respeito a um regramento de prudência nos gastos, não existindo,
contudo, tal previsão (de limitação) no ordenamento jurídico
brasileiro.
Ou
seja, a previsão legal existente e que limita a doação de gastos
em campanha, do particular para o candidato ou partido, não
prevalece para a limitação de gastos próprios em campanha, o que
enseja a possibilidade de abertura de discussão sobre a presente
matéria, cabendo ao Poder Judiciário Eleitoral ou mesmo ao Supremo
Tribunal Federal (STF) decidir sobre o acerto ou incorreção na
inovação na normatização eleitoral, possuindo o TSE atribuição
(art. 105 da Lei nº 9.504/97) regulamentadora, “sem
restringir direitos ou estabelecer sanções distintas das previstas
nesta Lei” (art.
105).
(Rodrigo
Ribeiro Cavalcante, servidor do TRE/CE e Sócio do IBRADE –
Instituto Brasileiro de Direito Eleitoral. Artigo publicado no
Caderno Direito & Justiça, do Jornal O Estado, p. 2, edição de
27
de março
de 2014)
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