Consulta em matéria eleitoral. Fundo especial de financiamento de campanha. O TSE decidirá depois de o STF ter decidido.
Veja:
“Um grupo de deputadas e senadoras
apresentou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) uma consulta sobre a aplicação
do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, o chamado Fundo Eleitoral.
Na petição, as parlamentares
perguntam se os recursos do fundo a serem aplicados nas candidaturas femininas
devem se equiparar ao patamar mínimo de 30% previsto na Lei das Eleições (Lei
nº 9.504/97 – artigo 10, parágrafo 3º). A Consulta também indaga se um
percentual superior a 30% de candidaturas femininas faria jus a tempo
proporcional de propaganda eleitoral nas campanhas gratuitas veiculadas em
rádio e TV.
Desde 2009, a Lei nº 9.504/97
determina que, nas eleições proporcionais (para os cargos de deputado federal,
estadual e distrital e de vereador), “(...) cada partido ou coligação
preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”.
São as chamadas “cotas de gênero”. A consulta questiona se a cota de
financiamento destinada às campanhas deve seguir esse mesmo patamar (30%).
“Vale frisar que as ações
afirmativas se justificam para compensar erros históricos do passado e para
promover a diversidade a partir dos objetivos do Estado Democrático de Direito
preconizados pela Constituição da República de 1988”, diz o texto da Consulta.
A relatora do caso no TSE é a
ministra Rosa Weber. O grupo de parlamentares que apresentou a Consulta é
formado pelas senadoras Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Ângela Portela (PDT-RR),
Fátima Bezerra (PT-RN), Gleisi Hoffmann (PT-PR), Kátia Abreu (sem partido -TO),
Regina Sousa (PT-PI), Lídice da Mata (PSB-BA) e Rose de Freitas (PMDB-ES); e
também pelas deputadas federais Gorete Pereira (PR-CE), Jô Moraes (PCdoB-MG),
Luana Costa (PSB-MA), Luciana Santos (PCdoB-PE), Raquel Muniz (PSD-MG) e Soraya
Santos (PMDB-RJ).
Confira, a seguir, a íntegra das
perguntas listadas na Consulta:
a ) Aplica-se a decisão do STF que
conferiu interpretação conforme à Constituição, proferida na ADI 5617, para a
distribuição do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, previsto nos
artigos 16-C e 16-D, da Lei das Eleições, devendo-se equiparar o mínimo de
recursos destinado a cada partido, ao patamar legal mínimo de 30% de
candidaturas femininas, nos termos do artigo 10, § 3°, da Lei 9.504/97?
b) Havendo percentual mais elevado do que 30%
de candidaturas femininas, o mínimo de recursos globais do partido, destinado
às respectivas campanhas, deve ser na mesma proporção?
c) Aplica-se a decisão do STF que conferiu
interpretação conforme à Constituição, proferida na ADI 5617, para a
distribuição do tempo da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão,
prevista nos artigos 47 e seguintes, da Lei das Eleições, devendo-se equiparar
o mínimo de tempo destinado a cada partido, ao patamar legal mínimo de 30% de
candidaturas femininas, nos termos do art. 10, § 3° da Lei 9.504/97?
d) Havendo percentual mais elevado do que 30%
de candidaturas femininas, o mínimo do tempo da propaganda eleitoral gratuita
no rádio e na televisão, destinado às respectivas campanhas, deve ser na mesma
proporção?
Por determinação legal, compete ao
TSE responder consultas sobre matéria eleitoral feitas por autoridades com
jurisdição federal ou órgão nacional de partido político. A previsão está
expressa no artigo 23, inciso XII, do Código Eleitoral. Essas consultas não têm
caráter vinculante, mas podem servir de suporte para as razões do julgador.
ADI
5617
A Consulta das parlamentares foi
motivada por recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da Ação Direta
de Inconstitucionalidade (ADI) 5617, que regulou a
distribuição de recursos do Fundo Partidário destinado ao financiamento das
campanhas eleitorais para candidaturas de mulheres. Na ocasião, decidiu-se que
a distribuição deve ser feita na exata proporção das candidaturas de ambos os
sexos, respeitado o patamar mínimo de 30%.
Processo relacionado: 060025218.2018.6000000” (http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2018/Marco/parlamentares-consultam-tse-sobre-cota-do-fundo-eleitoral-para-candidaturas-femininas>
consulta realizada em 21-3-2018, às 9h27min)
“O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu,
por maioria de votos, que a distribuição de recursos do Fundo Partidário
destinado ao financiamento das campanhas eleitorais direcionadas às
candidaturas de mulheres deve ser feita na exata proporção das candidaturas de
ambos os sexos, respeitado o patamar mínimo de 30% de candidatas mulheres
previsto no artigo 10 , parágrafo 3º, da Lei 9.504/1997 (Lei das Eleições). No
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5617, o nesta
quinta-feira (15), o Plenário decidiu ainda que é inconstitucional a fixação de
prazo para esta regra, como determina a lei, e que a distribuição não
discriminatória deve perdurar enquanto for justificada a necessidade de
composição mínima das candidaturas femininas.
A ação foi ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para
questionar o artigo 9º da Lei 13.165/2015 (Minirreforma Eleitoral de 2015) que
estabelece percentuais mínimo e máximo de recursos do Fundo Partidário para
aplicação em campanhas eleitorais de mulheres, fixando prazo de vigência da
regra. De acordo com o dispositivo, nas três eleições que se seguirem à
publicação da lei, os partidos reservarão, em contas bancárias específicas para
este fim, no mínimo 5% e no máximo 15% do montante do Fundo Partidário
destinado ao financiamento das campanhas eleitorais para aplicação nas
campanhas de suas candidatas.
A PGR sustentava que a norma contraria o princípio fundamental da
igualdade e que o limite máximo de 15% previsto na lei produz mais desigualdade
e menos pluralismo nas posições de gênero. “Se não há limites máximos para
financiamento de campanhas de homens, não se podem fixar limites máximos para
as mulheres”, afirmou. Quanto ao limite mínimo, enfatizou que o patamar de 5%
dos recursos para as candidatas protege de forma deficiente os direitos
políticos das mulheres. Segundo a Procuradoria, o princípio da proporcionalidade
só seria atendido se o percentual fosse de 30%, patamar mínimo de candidaturas
femininas previstas em lei.
Amici curiae
Representantes da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político
(Abradep) e da Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação (CEPIA), que se
manifestaram da tribuna na condição de amigos da Corte, defenderam a
procedência da ADI sustentando que o dispositivo questionado estabelece uma
discriminação ilícita e fere diversos princípios fundamentais, como o princípio
democrático, que tem por base o pluralismo político e se alicerça na
diversidade de representação. De acordo com a representante da Abradep, a norma
também fere a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
contra a Mulher.
Já a representante da CEPIA salientou que, apesar de dizer que busca
estimular a participação da mulher na política, a lei é, na verdade, “um
retumbante retrocesso e uma fraude”. Segundo ela, o dispositivo limita verbas
de campanha para mulheres em irrisórios 15%, o que, inclusive, viola a
autonomia partidária, uma vez que não autoriza o partido, caso queira, a
investir mais de 15% nas campanhas de mulheres e ainda permite que campanhas
masculinas possam ficar com até 95% dos recursos.
Relator
O ministro Edson Fachin, relator, frisou inicialmente em seu voto que é
próprio do direito à igualdade a possibilidade de uma desequiparação, desde que
seja pontual e tenha por objetivo superar uma desigualdade histórica. Nesse
sentido, lembrou que, apesar de atualmente as mulheres serem mais da metade da
população e do eleitorado brasileiro, apenas 9,9% do Congresso Nacional é
formado por mulheres e apenas 11% das prefeituras é comandada por elas.
Contudo, o ministro entendeu que a disposição constante do artigo 9º da
Lei 13.165/2015 é manifestamente inconstitucional, uma vez que o
estabelecimento de um piso de 5% significa, na prática, que, na distribuição
dos recursos públicos, a legenda deve destinar às candidaturas quociente tal
que os homens podem acabar recebendo até 95% dos recursos do fundo, como
alertado pelas amici curiae que
se manifestaram durante o julgamento.
O ministro salientou ainda que o caráter público dos recursos em debate
é mais um elemento a reforçar o compromisso de que sua distribuição não se dê
de forma discriminatória. Por isso, ressaltou que os partidos não podem criar
distinções baseadas no gênero do candidato. As legendas, segundo Fachin, devem
se comprometer com seu papel de transformação da realidade e se dedicar à promoção
e difusão da participação política das mulheres. “Só assim a democracia será
inteira”, concluiu.
Para o ministro Edson Fachin, a única interpretação constitucional
admissível é que a distribuição dos recursos do Fundo Partidário deve ser feita
na exata proporção das candidaturas de ambos os sexos, respeitado o patamar
mínimo de 30% de candidaturas femininas, por equiparação com a previsão do
artigo 10, parágrafo 3º, da Lei 9.504/1997. O ministro também considerou
inconstitucional a fixação de prazo de três eleições, uma vez que, segundo seu
entendimento, a distribuição não discriminatória deve perdurar, ainda que
transitoriamente, enquanto for justificada a composição mínima das candidaturas
femininas.
Por fim, o ministro salientou que devem ser consideradas
inconstitucionais, por arrastamento, os parágrafos 5º-A e 7º do artigo 44 da
Lei dos Partidos Políticos (Lei 9.096/1995), que tratam dos recursos
específicos para a criação e manutenção de programas de promoção e difusão da
participação política das mulheres
Demais votos
Ao acompanhar o relator, o ministro Alexandre de Moraes frisou que é
opção do partido político apostar em determinados candidatos e distribuir os
recursos do fundo, desde que respeite a ação afirmativa prevista no
dispositivo. O ministro Luís Roberto Barroso realçou os números apresentados
pelo relator quanto à participação feminina mínima na política brasileira, mas
lembrou que, quando se trata de cargos de investidura técnica, providos por
mérito e qualificação, as mulheres já ocupam mais de 50% das vagas no serviço
público.
A participação feminina só vai aumentar no campo da política por meio
de políticas públicas e incentivos trazido pelas leis, para assegurar igualdade
formal, salientou em seu voto a ministra Rosa Weber. Já o ministro Luiz Fux
citou estudos que apontam que a participação feminina na política depende de
ações afirmativas. Segundo ele, as mulheres devem ter acesso aos mesmos
instrumentos garantidos às candidaturas masculinas, sem discriminação.
O ministro Dias Toffoli ressaltou que a decisão do STF é um reforço à
igualdade de gênero, prevista no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal,
o que inclui o processo político eleitoral e partidário. Para o ministro
Ricardo Lewandowski, a decisão da Corte nesse caso é necessária, mas não
suficiente para resolver a desigualdade entre mulheres e homens na política. Em
seu voto, contudo, propôs que fosse excluído do texto do artigo 9º da Lei
13.165/2015 a parte final que diz “incluídos nesse valor os recursos a que se
refere o inciso V do artigo 44 da Lei no 9.096, de 19 de setembro de 1995”, mas
a proposta não foi acolhida pela maioria dos ministros.
Última a votar, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, também
acompanhou integralmente o voto do relator, lembrando que a mulher ainda vive
muitos preconceitos.
Divergência pontual
O ministro Marco Aurélio divergiu pontualmente do relator. Ele entendeu
que o artigo 9º caracteriza uma ação afirmativa válida, mas se limitou ao
pedido constante da ADI e votou pela procedência parcial para dar interpretação
conforme a Constituição ao artigo 9º, no sentido de que não se tem no
dispositivo a imposição de um teto para eventuais candidaturas femininas. Ele
foi acompanhado pelo ministro Gilmar Mendes.” (ADI 5617)
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