Asfixia
[Microconto]
Asfixia
De
Rodrigo Ribeiro Cavalcante
Helmer
demonstrava cansaço. Dois filhos, um marido, uma rotina de lar e trabalho, tudo
esmagador. A vida mudou muito, notadamente para a mulher. Tem horas que a
vontade é sumir, e voltar depois de tudo resolvido. Voltar? Tal exaustão
sentida por ela também tinha, e muito, relação com o afeto conjugal. Vinte anos
de casados não dois carnavais. Acumulam-se êxitos, mas também frustrações e
desânimos. Era um casal normal, que demonstrava equilíbrio. Mas como para tudo,
os desgastes são rotina mesmo. Nessa hora, parcimônia.
–Helmer
é calma.
–O
casal é tranqüilo!
Pois
é. Muitas vezes a aparência não denuncia as angústias de um relacionamento.
Quem não as tiver – as angústias – parabéns! É comum o autoengano passar a ser
regra; noutras, nem mesmo se percebe o real. Helmer repensava a sua vida.
Seriam interessantes novas experiências? Mudar!? Não que tivesse algo em vista.
Não mesmo. Ela tinha ciência dos seus compromissos. E isso em tudo. Aliás, essa
era uma percepção mútua, como deve ser. Nem mesmo houvera qualquer interesse
outro, de parte a parte. Não! Mas parecia estar surgindo um reclame ao novo
pelo novo, por parte de Helmer. Algo para ela somente, em que pudesse pensar a
vida; não precisar fazer; que lhe fosse possível sentir-se, a si mesma e
sozinha, apenas, em silêncio. E lhe passou a vir, a todo instante, a vontade da
fuga, talvez sem que ele, o marido, percebesse. Até por seu perfil acomodado.
Era a ele sempre mais oportuno pensar que tudo ia, que o tempo é o tempo, e que
o mais, ou o menos, é resultado da vida. Helmer não. Mulher é menos pragmática,
quando o tema é o sentir o existir. A rotina do mundo lhe sugara tudo a ponto
de perceber que, embora o casal sempre nutrisse o bem-querer e respeito
recíprocos, fosse preciso um compromisso consigo mesma. Até o dia em que,
sentindo crescer o cheiro da liberdade, ela tomou uma decisão firma: iria ter
uma conversa com o marido. Terça-feira à noite, 7 de maio, coincidentemente dia
do silêncio. Ele chega a casa, no horário de costume. O mais velho havia saído.
Iria fazer uma atividade escolar na casa de um amigo, e por lá dormiria, para a
sequência do dia seguinte. Ao mais novo, desejou-lhe boa noite, porquanto já
estava embalado ao sono. Disse à mulher que tomaria um banho. E foi. Ela, ao
tempo em preparava coisa pouca ao jantar, aguardava-o. Ele, poucos minutos
depois, adentra à sala de jantar. Um semblante alegre; algo que aqui e acolá
lhe era comum. Veio em traje sutil.
–Quer
queijo? Fiz para você.
–Não,
obrigado, meu amor!
Ela também havia adentrado ao lar fazia pouco tempo. Ele avistou-lhe o desenho do vermelho de sua boca, em batom-ardente. Fez-lhe um carinho no pescoço; beijou-lhe os lábios, suavemente, mas com uma penetração de paixão que a ela ressurgiu um sentimento interior a lhe trazer uma sensação quente no corpo todo. Ele, no ato, disse-lhe algo no ouvido, acariciando seu busto, como nunca. Ela, ao sentir disparar o coração ofegante e, lembrando-se de uma lingerie adquirida meses atrás, riu e disse-lhe: “Amor, aguarde-me só um instantinho!”
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